segunda-feira, 21 de junho de 2010

Amílcar de Castro

A obra de Amílcar de Castro, com a de outros artistas significativos de sua geração é muito mais rica e variada do que os estudos e o material iconográfico existentes a seu respeito.  As limitações do tempo e recursos obrigou-nos a excluir do livro momentos da atividade do artista: seu trabalho como diagramador nas décadas de 50 e 60, e os desenhos e gravuras coloridos nos últimos anos. Coleção própria do artista. A datação das obras, só é assegurada pela margem de uma década pois Amilcar tem o habito de datar apenas seus desenhos.
Os textos de Ferreira Gullar e Helio Oiticica sobre as esculturas de Almicar de Castro denominados textos neoconcretos dão uma idéia do clima intelectual e artístico em que o artista constituiu os passos decisivos de sua obra.
As obras de Amílcar de Castro como toda escultura em geral, não são fáceis de fotografar. Pedro Franciose teve que captalas em condições de luz e ambiente muito diverso.
O projeto gráfico de Rodrigo de Andrade, Fábio Miguez, Paulo Monteiro, Germana Monte-Mor e Márcia Pastore procurou assemelhar-se a sua visualidade, aos cortes, ao ritmo e mesmo ao peso das obras do artista.
Sua obra tem representado persistência, rigor e esperança para que os que se decidem pela arte.
Submeter um elemento a contornos severos pode ser uma maneira de trazê-lo à tona, retira-lo da indiferença que a ausência de limites produz. Acontece também desses recortes sobre saírem em demasia visando formas insensíveis ao material que lhes dá realidade. Trabalho de Amilcar de Castro precisa adquirir os significados de precisão e parcimônia. Traços econômicos, poucos cortes que determinam a estrutura da enorme força – proporciona uma dimensão moral e critica admirável.
A nesses trabalhos uma ética do risco. Gestos e práticas produzem desdobramentos incontornáveis. O mundo que surge nessas obras tem uma carne resistente. Essas formas procuram a maneira de se livrarem das unidades monolíticas e dos nexos aparentemente inelutáveis.
A multiplicidade de relações retirada da mansidão de um retângulo, por exemplo: peças de cortes, sem dobra – é a prova cabal de que o mundo contem um amplo potencial de sentidos.
A precisão dos traços e a presença ostensiva do ferro – uma combinação que não se alcança facilmente.
As relações configuradas num objeto de arte a condição de modelo para as demais relações – tem grande importância nesses trabalhos.
Sua ligação com o construtivismo, que tanto o partido tirou dessa nação, se mostra também na determinação formal acentuada e na vontade de ordenação.
Nas esculturas e desenhos, Amilcar de Castro se impõe uma dificuldade extremamente produtiva a ressaltar também o que há de problemático no universo construtivista.
O meio que partem essas figuras tem uma importância considerável. A oposição do ferro as torções – a ausência de solda nas peças não é causal – a pouca liquidez das tintas dos desenhos – seus aspectos ásperos e secos estão a indicar que existe, ao menos aqui, um elemento que emperra as formalizações por demais unívocas.
Amilcar de Castro costuma repetir que “alumino não tem caráter, sua maleabilidade disponibiliza a varias modulações. O alumínio – parece não sentir a passagem do tempo.
Já na escultura de Amilcar de Castro a ferrugem das superfícies testemunha o encontro de dois tempos muitos diversos, injunção de ordem variada.
O otimismo construtivista precisa conviver com o lastro possante – passa que imobiliza agenciamento abrupto e teria a leveza do primeiro dia.
Como a ferrugem é toda herança colonial que venha a tona. Sobre a clareza formal dessas peças sobre o frescor de articulações tão límpidas pesa a lembrança de arcaísmo social que se pode reverter apenas com estruturas complexas e relação decidida.
Entre a corrosão da ferrugem e o traçado cristalino, entre a crueza do minério e a pureza do metal surge atividade que conduz de um a outro. Nas esculturas as minas gerais vão muito alem do localismo geográfico e anedótico – esforço insano de extrair riqueza do solo permanece nelas.
Sabendo recompor as chapas de ferro, mas uma camada espessa de trabalho bloqueia essa aproximação. Por isso passo empregado na construção das obras é insuficiente para apreendê-las ou pacificá-las – procedimento que impedem que caminhemos sobre suas pegadas, no intuito de resgatarmos seus sentidos.
São questões de ordem que levantam uma forte objeção ao cosmopolitismo construtivista.
Amilcar pode ver na IV bienal de São Paulo, em 1957 do escultor espanhol Oteiza, que tiveram importância em sua formação – caixas vazias, por exemplo, mostra ao delírio da ordem ortodoxia construtiva – sem necessidade de ordenar.
Clareza estrutural – a lucidez do projeto precisa incorporar a opacidade social que materializa.
Precisão dos cortes, lado bruto e pesado – origem em uma história cruel, impossibilitando autonomia dos procedimentos.
Aquecer, cortar, dobrar, deslocar, podem descrever atividades dignificantes, a submeter a designos humanos – mas também para indicar tarefas exaustivas.
Os bólides de Hélio Oiticica – de quem Amilcar foi companheiro neoconcretismo – tinham a capacidade de produzir cores encardidas. Nas esculturas de Amilcar de Castro é o estranhamento obtido entre a vontade de ordem e a resistência das coisas que ressalta o trabalho presente nas obras afastamento a ilusão de estruturas cristalinas. Se repelem a idéia de procedimentos possíveis a serem reconstituídos perceptivamente.
Nas peças, sobressaem características particulares. A densidade do ferro, a violência dos golpes, torna-o mais lento.
Mesmo nos desenhos, onde a gestualidade se acentua, boa parte vivacidade advém dos rastros deixados pelo pincel ou pela vassoura – ou seja, estrias que apontam ausência de uma substancia fluida.
 A respeito da obra de Amilcar de Castro – seja correto falar de um predomínio expressivo da matéria. Tencionadas, estiradas ou deslocadas, as superfícies tem suas presença acentuada – reforça a firmeza dos elementos, inviabilizando sua sublimação. Pelas partes vazadas aragem abranda uma suave dispersão, tornando-as mais generosas, as tocas com o meio. Mas os contatos vão alem de um delineamento poético do espaço.
Franz Weissmann – com quem Amilcar estudou no final da década de 40 – procura, sim, esse sutil ordenamento espacial, compensando a continuidade do mundo por meio de modulações complexas.
As cores vivas que cobrem as chapas metálicas mostram bem que a preocupação de Weissmann volta – se mais para esse cadenciamento espacial do que para uma intensificação da presença das coisas.
O colorido forte limita o vazio convertendo em qualidade o que era quantidade o que era quantidade.
Nas esculturas de Amilcar, tem uma beleza pictórica inegável. Sua porosidade torna as chapas mais leves, da à atmosfera um poder de corrosão que não se vê nos trabalhos de Weissmann.
O modo de deliminar – sua maneira de criar e articular espaços e coisas, também diferencia a arte de Amilcar de outros importantes artistas neoconcretos.
O desdobramento formal que superasse o contraste entre figura e fundo levou Hélio Oiticica e Lygia Clark a trazer seus trabalhos para o espaço, colocando em liberdade aos limites pelo plano pictórico.
Lygia Clark, percurso que leva a superfícies moduladas ao túnel – passando pelos bichos, trepantes, obras moles a casa é o corpo, boba antropofágica entre outros – movimento quase paradoxal: trajetória do plano ao volume gera formas cujo é de uma interioridade crescente.
Para vários artistas neoconcretos o esforço para romper com a separação arte-vida levou paradoxalmente, a supressão de toda alteridade por meio de uma identificação da experiencia estética com a criação de mundos altamente intensos e sem fissuras.
Na obra de Amilcar de Castro o importante está em salientar a irredutibilidade da existência a vivencias particulares.
Existe monumentabilidade – deriva da dimensão impessoal por sua dinâmica.
Traçam limites entre limites entre regiões tao distintas e configurados descartam a sedução da indiferenciação.
Amilcar estudou com Guignard na década de 40, ficou a clareza definida por Guignard nas aulas de desenho.
A insistência para que os alunos usassem lápis duro, exigiam decisão no traço, pois os livros não tinham conserto.
A comparação da obra dos dois artistas vai alem das diferenças estéticas.
Guignard – leva ao limite trauma que marca a arte brasileira. Sua pintura (paisagens) – tem qualidade indiscutível – onde nada alcança definição precisa – cores e planos se misturam e se combinam. Parece ocultar realidade mais intensa (? percepção).
Já Amilcar, se rejeita a formalização demasiada univoca de certo construtivismo trabalha para concretizá-lo.
A monumentalidade desse movimento deve afastar qualquer dimensão simbólica.
A aversão de Guignard aos limites se transforma na obra de Amilcar, na alegria de multiplicar as relações e os espaços.
As esculturas de corte e deslocamento, sem dobras – que começão a ser feitas na década de 70 não são extrovertidas.
A expressura das chapas nesses trabalhos chega a 4 polegadas.
O corte e a dobra têm no máximo 2 polegadas.
Elas não demonstram a mesma desenvoltura das esculturas de corte e dobra. Cismadas, elas teimam em ser mais lugar que espaço.
As linhas que correm no interior dos blocos de ferro produzem um contraste com essa contenção.
Pelas trilhas abertas o maçarico passa uma luz fina forte para construir desenhos.
A luz que secciona as chapas de ferro não teria capacidade de corte se não sofresse um estreitamento que lhe fornece gume.
Amilcar vê grande afinidade esculturas de corte e a pintura de Morandi.
O tonalismo morandiano – à semelhança das superfícies ferruginosas de Amilcar – não é indicador de transições indolentes.
A vizinhança entre os objetos e o espaço quer lançar condições de um processo de diversificação substantivo, no qual as ores precisam conquistar um estatuto grave, a indicar resistência das coisas, em lugar de adjetivá-las.
Em toda obra de Amilcar de Castro original é a forma capaz de se mostrar da maneira mais evidente, a partir de intervenções rigorosas que recusem o recalque da matéria que lhe dá realidade.
Amilcar de Castro fez com mestria esculturas, desenhos – pinturas, gravuras, cerâmicas e trabalhos gráficos inaugurais.
A capacidade de passar de um meio a outro sem perder a tensão que move sua obra dá provas da dimensão de seu fazer e de sua política. Mas, sobretudo demonstra a veracidade e a sinceridade de sua arte. O reconhecimento e o respeito aos diferentes materiais e atividades e o modo generoso de conquistar a forma são o testemunho definitivo de grandeza dessa ação e dessa obra.
1. Boa parte das esculturas usa aço cor-ten que tem peculiaridade de enferrujar apenas até um determinado ponto, a partir do qual a oxidação cessa.
2. Estudou escultura figurativa com Weissiano, não pressupõe a comparação dos dois artistas, apenas seus traços são semelhantes que surgiu posteriormente.

Texto de Rodrigo Naves
Ensaio de Ronaldo Brito
Fotografias de Pedro Franciosi
Organizado por Alberto Tassinari
Cosac & Nayfe edições São Paulo, 1997.

Um comentário:

  1. Bacana estou vendendo pç do artista Amilcar de Castro se souber de alguem, http://contagem.olx.com.br/amilcar-de-castro-escultura-em-ferro-corte-e-dobra-iid-672912991

    Grato!

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